…”olhos entreabertos vendo correr em sentido contrário”…

Gota a gota se unia e outra a outras mais, pequenos borrões escorregando de cima a baixo embotando o translúcido do vidro, cortinas afastadas, olhos entreabertos vendo correr em sentido contrário aquela barreira de arvorezinhas zibelinas, a passar, passar, passar, passar, passar, passar, e a passar, filme mudo sem freios. Idênticos paus corridos duma cerca natural.
Logo mais vinha a ponte, e num piscar já ficando bem para trás agora, colocando-se entre ela e a imensidão de gelo onde mergulhara as lembranças que se cristalizavam em finíssimas laminas de dor se imiscuindo sorrateiras,
dos pés à cabeça, com parada obrigatória num apertado coração que cobrava desafogo e urgência de botar prá correr o choro, como a chuva ranzinza que no lá fora, vergastava em ondas aquela paisagem mimética.
Aos poucos a mente foi silenciando com a sensação de uma linha de prumo jogada ao fundo com o pendulo cessando aos poucos seu movimento.
Ficou vendo uma só gota descer e mais outra ir sumindo no translúcido do vidro à medida que a chuva passava.

Carlos Costa, Meireles, nove de outubro de 2009.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Zibelina